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PAULA VAZ

(BRASIL – MINAS GERAIS)

 

Paula Vaz é poeta e psicanalista  e mora em Belo Horizonte, Minas Gerais.

Autora dos livros:

O Reino animal da Poesia. Publicado pela Cas’a Edições em 2022 e lançado na livraria Quixote. BH. MG
Deserto. Publicado e lançado pela Cas’a Edições em 2018 na cidade de Belo Horizonte, Minas Gerais.
A outra língua: Amor. Publicado pela Cas’a Ediçoes  em 2016 e lançado na livraria Scriptum em Belo Horizonte, Minas Gerais.
Não se sai de árvore por meios de árvore. Ponge-Poesia. Publicado pela Cas’a Edições em 2014 e lançado na livraria Scriptum em Belo  Horizonte, Minas Gerais.

 

ENTRELINHAS , VERSOS CONTEMPORÂNEOS MINEIROS.   Organização: Vera Casa Nova, Kaio Carmona, Marcelo Dolabela.  Belo Horizonte, MG:  Quixote + Do Editoras Associadas, 2020.  577 p.  ISBN 978-85—66236-64—2            Ex. biblioteca de Antonio Miranda

 

A nova língua

No começo era o néctar
Nem mesmo o filho da Prudência evitaria
Em seguida o semi-sono no jardim de Zeus
Recurso a se perder na noite escura
por tantos Poros aberto à Penúria
vai se chamar: Amor.


A esperança

Se sua antena é maior que seu corpo,
pode ser que você seja uma esperança.
Se seu corpo é verde
e tem o formato exato de uma folha,
se é capaz de incluir-se numa floresta
e camuflar-se ali
a ponto de fazer realmente parte dela,
se você canta como as cigarras,
mas seu som é inaudível aos ouvidos humanos,
talvez você seja uma esperança.
Se seus ouvidos estão instalados em suas pernas
e é com elas que escura o rumo
que deve dar aos seus passos,
se fia acordada durante a noite,
não por insônia,
mas por gosto da noite,
se tem o olhar voltado para o céu
no exato momento em que joelhas dobrados
ao chão
se, se nessa posição em que parecia querer rezar,
você salta para bem longe,
se tem sempre a impressão de que a vida é curta
e você sane que nasceu na primavera,
que amadurece no verão,
mas não suportaria o rigor de um invernada,
é bem possível que seja mesmo uma esperança.
Se, no outono,
como uma folha, você cai
e deixa na terra a sua semente,
porque essa, sim, resiste aos tempos frios
— encapsulada por uma casca fina que se rompe na
primavera —
e, se não é de você,
mas de seus ovos,
que nascem novas perspectivas,
você, que achava que era apenas suma folhinha:
Bendito é o nome do fruto do vosso ventre,
Amém.



Página em branco

E o deserto é uma página em branco
esse espaço desabitado
a mudez das coisas que perdem os seus nomes
essas terras de sede
esse território negligente
coberto de escombros
altar rodeado de velas
e a sagrada inquietude
de tudo que ainda não é silêncio

Todo livro é um deserto
porque a princípio
não temos palavras para  intensidade
e só interessa escrever
sobre aquilo que não temos palavras para dizer
Então é preciso pesca-las pelo mundo
inventá-las roubá-las
até que finalmente consigamos passar
o elefante da solidão pelo buraco de uma agulha

Escrever é encontrar o fio do buraco de um agulha
onde quer que ele esteja
no horizonte
nas bordas do mar
perto de você

    É esse escrito que ofereço
às palavras que nos transbordam
às palavras que nos transportam
aos livros que precipitam livros

aos Cantos de amor e Não
porque O amor não vazará meus olhos
Nunca mais

Escrever é retornar à sala vazia
à copa de uma árvore
e escutar o que vive

É  não estar de acordo com as coisas como são
É querer modifica-las um pouco
se não saber o que virá

Essa moral de ser em direção ao fulgor

Como diria Duras
escrever na direção aos desertos
porque somos todas instruídas em dor
sem sombra
partida

Para cada deserto é preciso um artifício
que expresse a língua da sua natureza muda

O deserto é uma página em branco



Éramos

Alguém diz:
Eu te espero
e esperarei sempre.
Ela joga as palavras atrás do sofá,
mas elas voltam para a beirada da cama


Cristal natural

Penso em você como quem mói a carne naquele aparelho
antigo se enferrujado atarraxado a mesa.
O triturador cumpre o seu destino
Há séculos soturnos que separam nossas línguas
Entre nós, tanto muro, tanto tijolo
e essa lã misturada a vidro que recheia  a parede das casas
[ pré-fabricadas
A hora para. Não o conheço mais.
Tateio apenas as plantas, a relva, os artistas, os loucos
e todos aqueles seres vagalumes,
que ainda têm claridades.
E rogo ao horizonte das aves que sobrevoem o mar
a concessão de plainar sobre a superfície das águas
até que se revele a mim
o que fazer com aquele açúcar União
deixado aqui. 


*

Página publicada em maio 2024



 

 

 
 
 
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